16 de agosto de 2010

A Tribo

Costumeiramente, as segundas são-me muito mais agradáveis do que o dia da semana que a precede.

Aos domingos aquela sensação letárgica de que seria para descansar, acaba por terminar numa elegia ao ócio inútil. Elegia a esse tédio, que é rompida com o comparecimento a algum evento esporádico ou por força de alguma supresa positiva. Pois justamente no último domingo, caiu em minhas mãos, um exemplar do DVD-CD Speed Tribe.

Com efeito, não é um material novo, tendo em vista que foi lançado originalmente em 2002, sendo relançadas versões espaçadas desde 2006, mas versa sobre duas colunas que sustentam meu entusiasmo: 24 Horas de Le Mans e EBM.

O formato da proposta pode desagradar a quem espera uma leitura documental e ortodoxa que retrate a prova realizada em 2001, pois na verdade, se apresenta como um enorme clip de 50 minutos, dividido em 11 segmentos. E se visto como tal, a opção pelo experimentalismo da forma que foi retratada por Rod Chong e Sharon Matarazzo é impactante e escraviza a atenção ao longo do filme. Com uma edição que tange o perfeito e uma fotografia acima do que a proposta exigiria, não arranha nem rivaliza com a obra de 1971, estrelada por Steve McQueen e dirigida por Lee Katzin, pois qualquer comparação é por demais sem qualquer sentido.

Não bastando, o aspecto sonoro é putaqueparivelmente nervoso, seja o captado no ambiente, seja a trilha sonora desse clip versão long play, assinada pela metade do Front 242.

Sim, pois além do som dos pneus na pista molhada pela chuva, dos múrmúrios incompreensíveis da turba torcedora e agudo mastigar das engrenagens do câmbio, a trilha sonora ficou sob os cuidados de Daniel Bressanutti & Patrick Codenys. Sempre achei muito fácil, senão óbvio e preguiçoso, associar qualquer imagem de competição automobilística com power chords, solos arpeados de guitarra e bateria pandemônica. É fórmula corriqueira e que na maioria das vezes rende aplausos.

Mas, a via da EBM (no caso, mais do uma que trilha sonora ou música incidental, mas sim autêntica suite), adere à fotografia em tamanho e formas exatos. Reconheço que o entusiasmo é grande, principalmente pelo fato de ser exageradamente apreciador do som produzido pelo Front 242. Mas reconheço também, que seria do mesmo modo óbvio, socar qualquer melodia feita num sequenciador a 160 bpm e um loop de baixo e bateria, para emprestar dinâmica sonora às imagens. Acontece que não se procedeu assim: como clip longo que é, com variações de velocidade e na captação de detalhes, a peça musical acompanha os mesmos ditames, intercalada com a referida sonoridade ambiente.

Não é um filme para ser visto e escutado. Fica latente que assistir apenas umas duas vezes, incute a idéia de que se perdeu algum detalhe significativo, daí que é algo que se deve enxergar e escutar. Por inúmeras vezes.

7 de agosto de 2010

Anatomia do fascínio

Há pessoas elegantes e pessoas efeitadas.
Machado de Assis


A observação do maior escritor nacional, bem se aplica para tentar explicar o evidente gosto pela categoria de rali, dentre aquelas do automobilismo esportivo. Mesmo nos tempos atuais, onde o fabuloso Sébastien Loeb empresta um caráter de previsibilidade, o atrativo nunca foi o que determinada dupla ou marca ganhou, mas como ganhou.

Desde as provas seminais até a criação do WRC, sempre houveram etapas divertidas e trágicas. Temos a utilização de um tanque extra de combustível, bem escondido, no carro utilizado por Benito Mussolini em provas de longa distância (o que lhe conferia ligeira vantagem sobre os adversários), ao público local interferindo com um bloco de gelo que retirou da competição (e da iminente vitória) o Porsche de Jean Luc Therier, para vitória do R5 Turbo de Jean Ragnotti no Rally de Monte Carlo de 1981.

Mesma prova, só que em 1966, teve os três primeiros lugares conquistados por duplas conduzindo Mini Coopers S. Ganharam por pouco tempo, pois causava espécie que aquele nano veículo, pudesse superar qualquer outro veículo - ainda mais francês. É a famosa história dos faróis Lucas, cujos filamentos das lâmpadas, estavam em desacordo com as regras de trânsito da França. Daí além dos três Minis, sobrou a mesma penalização ao Lotus Cortina de Roger Clark, que utilizava idênticas lâmpadas halógenas.

Oui mes amis: o quinto colocado, Pauli Toivonen, foi promovido a primeiro. Cujo Citroën ID, estava dentro das regras de trânsito francesas, sim senhor!

Afora detalhes impertinentes desses naipes, mesmo a meio tanta lama, buracos, poeira, charcos e paredes humanas, é a mais elegante das categorias do automobilismo.


3 de agosto de 2010

Estado de Arte

Invariavelmente nos deparamos com situações que adquirem uma sensação completamente diversa, da que é experimentada quando ocorrem. E no campo estético não se procede de modo diverso, tendo em vista que, o que até pouco tempo era de gosto duvidoso passe a ser atual e aceitável. E não raro, o caminho inverso também é percorrido.

Porém, o Citroën Ami 6 sempre foi horrendo. Sempre. Desde o seu lançamento em 1961. E sempre o será. O que não significa que não possa ser cultuado e se torne objeto de desejo de muitos. Inclusive eu.

Mesmo não entendendo, realmente, o exagero nas linhas poucos convencionais daquele modelo ( tento não ficar repetindo ser absurdamente feio ).

A perplexidade fica maior, ao saber que quem concebeu suas linhas foi Flaminio Bertoni, que, se já havia assinado entre 1930 e 1940, o mítico Traction Avant, o comercial H e o indubitável 2CV, se superou no inesquecível DS.

Se a funcionalidade e a proposta do projeto não exigiam grandes extrapolações com o Traction Avant, H e o 2CV – mais ainda sim, longe de terem à época, gosto duvidoso nas linhas – no DS há arrojo e, aí sim, extrapolação na estética. Então, fica sem sentido, que quase duas décadas depois, tenha vindo o esquisito Ami 6.

Contudo há sentido e lógica nesses parâmetros por demais subjetivos.

Pois esse italiano nascido no começo do Século XX, tornou-se projetista de carrocerias por necessidade, tendo que largar seus estudos em razão da morte do pai e jovem se tornar arrimo de sua família. Para tanto, começa a trabalhar junto à Carrozzeria Macchi.

E quando contratado pela Citroën, em uma única noite, esculpiu em definitivo o modelo do Tratcion Avant. Não bastando, ao mesmo tempo em que atuava junto à montadora, aventurava-se em mostras de arte, expondo suas esculturas.

Paralelamente, ainda atuando no segmento automotivo, gradua-se em arquitetura , tendo projetos erigidos nos subúrbios de Paris.

Deste modo, para quem considerava que esculpir uma peça de arte em pouca coisa diferenciava de se desenhar um carro, fica a razão de ser de seu derradeiro projeto.

Saber que o Ami 6 é fruto de um artista – isto no seu termo mais exato – não o torna menos feio. Mas ao artista de fato, é permitida toda e qualquer liberdade sem concessões.

Quem escreveu melhor.

2 de agosto de 2010

A Era dos Exageros II


Basicamente a receita já havia sido aprovada: 200 modelos fabricados em 12 meses ininterruptos; chassis tubular; alguma coisa que lembre a carroceria de origem; tecnologia high-end na motorização e números superlativos de potência, peso minimal.
E o investimento total, compreendendo até mesmo as ditas 200 unidades para efeitos de homologação, valia a pena: o sucesso de determinada marca no Grupo B, alavancava as vendas de seus modelos disponiibilizados.

O caminho sulcado pela Lancia e Audi nessa categoria, não deixou impassível seus concorrentes europeus: de olho nesse segmento esportivo, a Peugeot passou a desenvolver seu modelo anabolizado. Mesmo porque, não fazia o menor sentido apenas relembrar suas esporádicas vitórias em edições anteriores, conquistadas pelos modelos 404 e 504.

Assim, em 1984, cuidou de se socorrer do nanico e insonso 205, colocando uma usina XU8T com 1,775 litros, 4 cilindros, 16 válvulas e sobrealimentado por uma Garret que operava com 0,8 bar, entregando algo em torno de 200 hp aos 5.000 rpm para 1140 kg. Isso, recorde-se na versão de rua, já que a de competição, alivada em praticamente um terço do peso, e com alguma pressão na turbina e uma série de acertos na Bosch K-Jetronic, chegava a 450 hp aos 8.000 rpm, com um torque explosivo de 490 Nm aos 5.100 rpm.

Com motor disposto centralmente e com a adoção de kevlar e fibra de carbono - de uso ainda experimental para a época - a tração integral tornou tudo muito mais equilibrado. Tanto que foi um modelo vencedor, no curto hiato em que competiu.

E bem possivelmente, a visão de sua disposição mecânica é aquela que mais bem expressa esse período hiperlativo.




1 de agosto de 2010

Varla & Cia Ltda.

Imagine três dançarinas strippers, de formas físicas exageradamente exageradas, vestidas de forma a evidenciar esses exageros anatômicos sem quaisquer reservas, percorrendo paisagens não muito populosas com um Porsche 356C e, literalmente, arrumando treta de forma deliberada. Pois então.

O que é sedutor ao imaginário de quase todo homem e -convenhamos- mulher, é o leit motiv de Faster, Pussycat! Kill! Kill filme inesquecível de Russ Meyer. Esse diretor que iniciou carreira como fotógrafo de hã... modelos... hã... em poses de nú artístico para ...hã... revistas masculinas (prestando seus serviços para o então iniciante Hugh Hefner), co-escreveu e dirigiu essa trama, que de compreensão complicada nada tem.

Varla ( Tura Satana ), Billie ( Lori Willians ) e Rosie ( Barbarella 'Haji' Catton ), fazem Alex e seus droogs Dim, Georgie e Pete, retratados por Anthony Burgess n' A Laranja Mecânica parecerem apenas crianças emburradas e mimadas. Além de darem uma bucha num badalhoco que tava todo contente com seu esportivo inglês, o rapazola leva uma cura de porrada dessa tal Varla que, não contente, dá um Finish Him ! no garotão. De bônus, raptam a respectiva namorada. Tudo isso e, ao longo do filme, recheado de tomadas nas partes opulentas das moça.

Prestes a completar, no dia 6, 45 anos,essa película independente rodada em grande parte no deserto de Mojave, curiosamente tem como viaturas, essencialmente, esportivos europeus, pois além do já referido Porsche, ainda temos um improvável Triumph TR3A '58, além dois MG –um A MKI '59 e um B de '63.


Se a rigor é um filme hã... violento, o tom de comédia não foi desproposital e, a par de ser a seu modo, uma pornochanchada chauvinista, com as devidas liberdades de apreciação, nos parece muito mais feminista. Mormente, pelo que decorre após Linda ( Susan Bernard ) ser raptada e o encontro com um frentista boca mole, falar demais.

Encore!

Le Retour de Gordini from Definition Broadcast on Vimeo.